O movimento de extrema-direita Frente Nacional quer realizar uma manifestação "contra a criminalidade" no mesmo local em que a Rede Anti-Racista pretendia organizar a sua VI Festa da Diversidade.
A Frente Nacional convocou nos últimos dias, através da Internet, uma manifestação para sábado, às 14h, com partida na Praça de Martim Moniz e chegada no Rossio. O local de arranque da marcha é desde há alguns anos o ponto onde se realiza durante três dias a Festa da Diversidade. Este ano estava prevista para os dias 17 a 19 de Junho.
O PÚBLICO tentou contactar alguns dos responsáveis pela manifestação, não tendo nenhum respondido às solicitações de esclarecimentos. Segundo as informações disponíveis no sítio da Internet da FN, organização que contém elementos do movimento skinhead português, a manifestação está a ser organizada como um protesto contra o aumento da criminalidade. "Criminalidade dos gangs aumentou mais de 400 por cento nos últimos sete anos." O que aí surge escrito e as fotos inseridas dão a entender que esta é uma reacção ao "arrastão" ocorrido no último fim-de-semana prolongado na praia de Carcavelos. "Claro que os defensores do politicamente correcto e as associações do racismo vão fazer o esforço habitual para esconder aquilo que toda a gente sabe: que a imigração está associada à criminalidade. Houve fotos [sobre os assaltos na praia de Carcavelos] e todos os portugueses podem ver com os seus próprios olhos quem foram os autores de tão hediondo crime", pode ler-se. O ponto de encontro para a marcha não deixa margem para dúvidas: "Martim Moniz, 14 horas."
Esse é o local onde a Rede Anti-Racista pretendia realizar a sexta edição da Festa da Diversidade. Pretendia, mas já não pretende, ao que tudo indica por falta de autorização e apoio da Câmara Municipal de Lisboa. De acordo com José Falcão, dirigente da SOS Racismo, "estava para haver a Festa da Diversidade esta semana, que era no Martim Moniz. Já a cancelámos, porque, apesar de ter recebido ontem [anteontem] um papel a dizer [à organização] que não é a três dias que se autoriza um evento destes", explica.
O atraso da CML em dar uma resposta tem motivado numerosas críticas da organização. José Falcão afirmou ao PÚBLICO que os pedidos tinham sido enviados desde Março, sempre sem resposta formal. "A Festa tem sido travada por atitudes xenófobas da câmara", desabafa José Falcão, que enviou uma carta ao presidente, Pedro Santana Lopes, questionando-o sobre se "a câmara quer ou não apoiar a Festa da Diversidade". Segundo este dirigente, havia "várias maneiras de responder não", tendo o social-democrata respondido a "dizer sim, mas a fazer tudo para que na prática seja não".
A Câmara Municipal de Lisboa reagiu a estas críticas assegurando que a autorização já estava dada informalmente na semana passada. "Houve um telefonema a dar o OK à festa a semana passada, antes de se entrar nos feriados. No mesmo dia, seguiu por fax o ofício dando a autorização", explica o assessor de Santana Lopes, João Reis. Este adjunto do presidente da câmara acrescenta ainda que "foram enviados ofícios à Polícia de Segurança Pública, Polícia Municipal e junta de freguesia". "Por nós a Festa acontece no sábado", remata João Reis, já depois de frisar que este assunto fora "sempre tratado pelo gabinete da presidência", onde houve "abertura total" para a realização do evento.
Questionado sobre os riscos de uma manifestação skinhead para o mesmo local de uma festa multicultural, João Reis respondeu que a "PSP está avisada", tendo todos os meios "para assegurar a segurança desta festa".
A Festa da Diversidade organiza-se desde 1999, com um interregno o ano passado, também por falta de apoio da CML. É promovida pela Rede Anti-Racista com a inclusão associações culturais e de imigrantes, com o intuito de "mostrar o trabalho que desenvolve nas mais diversas áreas como a música, dança, gastronomia, teatro, artesanato, artes circenses, artes plásticas e debates". Durante o dia de ontem, outro responsável do SOS Racismo, Mamadou Ba, classificou a manifestação de "alto risco", podendo gerar um "conflito com consequências graves". "O Estado tem que actuar, para não lamentar danos maiores", declarou. O responsável estranhou também a data e o local escolhidos pela FN, considerando "muito estranho não haver reacções das autoridades, Câmara de Lisboa e governo civil".