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Amor de um homem

Jul 1997

Amo em silêncio. Sofro em silêncio.

Do meu silêncio, da minha solidão e do meu refúgio, nasceu alguém que já não conheço. O isolamento fez com que me perdesse dentro de mim. Já não sei quem sou.

Esta procura que agora faço, esta tentativa de reencontro, tem sido bastante sinuosa e espinhosa. Já percorri caminhos que nunca quis conhecer, e descobri o que jamais pensei existir. Tenho saudades da minha inocência, da loucura de pensar que era feliz.

Amo em silêncio. Sofro em silêncio.

Neste momento, enquanto escrevo estas linhas, há uma nostalgia que se apodera de mim. Uma lágrima envergonhada percorre as faces cansadas do meu rosto. Estou cansado. Cansado de me esconder perante mim e os outros. Sou gay. A minha lágrima é como outra qualquer. Uma lágrima como a de outro Homem qualquer. Uma lágrima igual à de tanta gente. No entanto, é uma lágrima diferente. É uma lágrima silenciosa e que todos fazem questão de silenciar.

Amo em silêncio. Sofro em silêncio.

A barreira que encontro nos outros alimenta os meus silêncios. Tenho medo de descobrir o que não quero. Ainda não estou preparado para perder aqueles que hoje se dizem meus amigos. Sim, sou gay. Sou o mesmo que sempre fui. Aquele em quem confiaram, aquele com quem já se riram e choraram, com quem falaram e cantaram. Mas ninguém me conhece. Não conhecem o homem que ama, que chora, que sofre e que sonha. Tenho medo de me mostrar. Medo que o vosso silêncio se junte ao meu. Medo de sair da minha solidão interior e ficar completamente só.

Amo em silêncio. Sofro em silêncio.

Sou gay. Será que ninguém compreende o valor do amor? Não será o meu amor igual ao dos outros? Será que amo de forma diferente? No meio de tantas incertezas só sei que o meu amor não tem fim. Amo indiscriminadamente. Amo paisagens, objectos, animais e pessoas. Amo sem olhar à cor, à cultura, à fortuna e ao sexo. O meu amor é superior a tudo isto e sinto-me feliz por isso. Não partilho esta felicidade com ninguém pois o vosso mundo não é assim. No mundo em que vivemos, o amor não existe. Existe sexo. Só podemos amar o outro sexo, não podemos simplesmente amar. O amor subjuga-se ao sexo e deixa-se limitar pelo corpo. É a isto que chamamos amor? Um sentimento escravo do físico? Onde está aquela nobreza, a superioridade, a irreverência e a juventude do amor? Porque nos prendemos tanto a velhos preconceitos? Porque nos preocupamos tanto com o que cada um faz na sua intimidade?

O sexo em si é um acto puramente carnal e animalesco. Mas o sexo também pode transmitir tudo aquilo que as palavras são incapazes de descrever. Para isso, primeiro é preciso que exista amor. Só o amor dá valor ao sexo. Só o amor lhe dá significado. Só o amor o faz transcender e permite juntar os amantes numa união inebriante. Porque nos limitamos ao sexo quando podemos ter amor? Só peço que me deixem amar e que fiquem felizes por mim. Peço-vos que me amem como eu vos amo, e que me deixem reservar o direito de escolher o meio pelo qual exprimo o meu amor.

Será pedir muito?

Será a minha felicidade uma barreira à felicidade dos outros?

Estarei a ser egoísta?

Talvez. Com tanto preconceito, questiono-me sobre tudo. Mas uma coisa é certa: não escolhi ser assim. Não tenho orgulho nem vergonha. Apenas sou assim. Sou gay. Agora só me quero conhecer para me poder amar também.

Sofro em silêncio. Amo em silêncio.

Não me deixem perder nem morrer. Ajudem-me a lutar e a sair do labirinto que construi dentro de mim. Sozinho não consigo. Mas convosco estou disposto a mudar-me e a mudar o Mundo.

Amo-vos.

Beast
Jul 97
 
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