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Sobre as leis de Uniões de Facto

Foram publicadas, no Diário da República, I Série-A, n.º 109, de 11/05/2001, as Leis n.ºs 6/2001 e 7/2001, aprovadas pela Assembleia da República no pretérito dia 15/03, adoptando medidas de protecção das pessoas que vivam em economia comum e de protecção das uniões de facto, respectivamente.

Estes diplomas não contêm (com a excepção a seguir mencionada) normas especiais que fixem a data da sua entrada em vigor, pelo que -- salvo no tocante às respectivas disposições com incidência orçamental (no caso, os preceitos que permitem aos parceiros de uma união de facto, ou às pessoas que vivam em economia comum usufruir da «aplicação do regime do imposto de rendimento das pessoas singulares nas mesmas condições dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens»: artigos 4.º, n.º 1, alínea c), e 7.º da Lei n.º 6/2001, e 3.º, alínea d), da Lei n.º 7/2001), que só terão aplicação com a publicação da lei do Orçamento do Estado para o ano de 2002, de acordo com o disposto no artigo 9.º da Lei n.º 6/2001 e no artigo 11.º da Lei n.º 7/2001 -- entrarão em vigor no 5.º dia posterior ao da publicação (por força do disposto no artigo 2.º, n.º 2, da Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro), ou seja, à meia noite do dia 16/05/2001.

Ambas as leis prevêem (a 6/2001, no seu artigo 8.º, e a 7/2001, no seu artigo 9.º), que o Governo regulamentará as respectivas normas que disso careçam (de notar que isso já estava previsto na Lei n.º 135/99, mas, ao que se saiba, nunca chegou a ser feito). No entanto, a maior parte dos preceitos dos dois diplomas pode ser objecto de imediata aplicação, ao menos no que de essencial estabelecem, sem qualquer regulamentação.

Assim, no que respeita ao acesso às pensões por morte, previsto no artigo 3.º, alínea e), da Lei n.º 7/2001, existe já legislação que, com ligeiras adaptações processuais impostas pelo artigo 6.º do mesmo diploma, estabelece os mecanismos a que os interessados têm de recorrer para fazerem valer os seus direitos. Por outro lado, o artigo 14.º-A do Código do IRS prevê já os termos em que os unidos de facto poderão usufruir do novo regime fiscal que lhes foi reconhecido (embora, repete-se, nesta parte a lei não entre imediatamente em vigor). Finalmente, no tocante ao direito à transmissão do arrendamento (e à protecção da casa de morada comum em geral), afigura-se-me que também nada é necessário regulamentar, já que o Regime do Arrendamento Urbano prevê os termos em que tal direito pode ser exercido, podendo recorrer-se ao Código Civil no que toca ao exercício dos direitos real de habitação e de preferência reconhecidos ao parceiro sobrevivo.

Isto afirma-se, naturalmente, sem prejuízo de se reconhecer que, num ou noutro ponto, é necessário «retocar» a legislação existente para acomodar o exercício, por parte dos unidos de facto, dos direitos que lhes foram agora reconhecidos (referimo-nos, em especial, ao caso das uniões de pessoas do mesmo sexo, já que é no tocante a estas que se poderão notar mais resistências à aplicação da nova legislação).

Com efeito, poderá ser algo problemático o exercício do direito a beneficiar do regime jurídico de férias, faltas, licenças e preferência na colocação dos funcionários da Administração Pública ou do regime jurídico de férias, feriados e faltas no âmbito do contrato individual de trabalho (artigos 3.º, alíneas b) e c), da Lei n.º 7/2001, e 4.º, n.º 1, alíneas a) e b), da Lei n.º 6/2001), embora mesmo neste ponto tal regulamentação será necessária não tanto para que a lei possa ser correctamente aplicada, mas mais para evitar que da sua aplicação redunde em discriminação. Seria bom, na verdade, que o legislador proscrevesse explicitamente qualquer tipo de discriminação contra os unidos de facto em virtude da aplicação da lei.

Para além disso, também em matéria de dissolução da união de facto, sobretudo em face do disposto no artigo 8.º, n.º 2, da Lei n.º 6/2001, poderá ser necessário aprovar legislação que esclareça em que termos se dará o recurso aos tribunais para o efeito.

A aplicação concreta das novas leis, no entanto, dependerá, em grande medida, do empenho com que os casais de pessoas do mesmo sexo exijam, no futuro, o respeito pelos direitos que agora lhes foram reconhecidos. De notar que se em alguns casos poderão beneficiar deles invocando o estatuto de vivência em economia comum (como lhes permite o artigo 1.º, n.º 3, da Lei n.º 6/2001), noutros isso não será possível porquanto é bem diverso o alcance, de acordo com a nova disciplina legal, do vínculo decorrente da união de facto e dessa situação de economia comum.

Miguel Freitas

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