Política & Direitos
Comunicado de Imprensa 24 de Fevereiro de 2010
Quatro anos depois do assassinato da transsexual Gisberta Salce Júnior
Tudo na mesma.
Completam-se amanhã quatro anos desde que foi encontrado o corpo de Gisberta, transsexual, toxicodependente, seropositiva, prostituta e imigrante brasileira, que sucumbiu a três dias de tortura e sevícias sexuais e posterior afogamento, ao ser lançada a um poço por um bando de rapazes no Porto. Ficou até hoje na memória colectiva um crime que "chocou o País". E, no entanto, parece não ser verdade: um país chocado, é um País que reage e previne. E não foi assim.
O problema está em que o referido "choque" não se estendeu à perda de uma vida, à exclusão social extrema em que esta vítima mortal estava encurralada, e sobre a qual, um ano depois, praticamente nenhuma intervenção teve lugar, e nada de concreto se alterou. O País pode acertar os relógios e continuar a contar os dias até à próxima Gisberta, talvez menos mediática mas nem por isso menos certa, como comprovou o assassinato, e posterior abadono num contentor de lixo, dois anos depois, de uma mulher transexual, desta vez em Lisboa, um caso ainda hoje por solucionar.
Quatro anos depois, a protecção legal de pessoas como Gisberta continua inexistente, e as condições de marginalização de grande parte da população transsexual continuam intocadas porque os decisores políticos e o Estado continuam a fugir às suas responsabilidades. Reivindicações como:
- a inclusão da proibição de discriminação em função da Identidade de Género no artigo 13º da CRP
- uma Lei de Identidade de Género que permita às pessoas trans alterar os seus documentos de acordo com o género assumido, melhorando amplamente as suas oportunidades de acesso ao emprego
- a retirada da transexualidade da lista de doenças mentais sem perda do direito à comparticipação estatal e aos tratamentos no Sistema Nacional de Saúde, à semelhança do que acaba de ser aprovado em França...
são direitos básicos que continuam sem eco junto dos partidos políticos
Por outro lado, num país campeão da violência sobre menores, o sistema de "guarda e protecção de menores" continua sem medidas de reforma para que seja mais do que um armazém de crianças e jovens, das quais metade entregues a instituições religiosas, sem contexto emocional ou educativo e onde se misturam crianças protegidas das suas famílias com outras institucionalizadas por cometerem crimes.
Nada se fez para limitar o impacto da exclusão social da maioria da população transsexual. A primeira violência de que esta é vítima, é institucional e legal.
Numa altura em que se o país ainda debate o casamento entre pessoas do mesmo sexo, lembremos que em Portugal ainda estamos na fase de debater medidas que poderiam significar a diferença entre a vida e a morte.
E, no entanto, mesmo que prejudicados/as pela inacção dos responsáveis políticos, e pelo preconceito e pela violência, não somos vítimas, mas sim pessoas, que exigem plenos direitos e o direito a uma vida digna - o direito a viver - e não admitem esperar pelos ritmos lentos da mudança de mentalidades na classe política para exigir o respeito pelos Direitos Humanos para todos e todas.
PANTERAS ROSA - FRENTE DE COMBATE À LESBIGAYTRANSFOBIA
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