Carta Aberta ao Conselho Executivo da Escola Secundário António Sérgio
Lisboa, 12 de Novembro de 2005
Exmos. Senhores,
A rede ex aequo - associação de jovens lésbicas, gays, bissexuais, transgéneros e simpatizantes tomou conhecimento, por via da comunicação social, das atitudes discriminatórias do Conselho Executivo da Escola Secundária António Sérgio, de Gaia, em relação às manifestações de carinho, como o beijar ou dar as mãos, que ocorreram entre duas jovens alunas na referida escola.
Muitas escolas em Portugal apresentam, infelizmente, um ambiente intolerante no que diz respeito à orientação sexual dos alunos, o que contribui não só para pôr em risco o igual acesso e usufruto do direito à educação a pessoas cuja sexualidade seja diferente da norma, como promove e valida actos negativos e persecutórios contra as mesmas.
O professor António Teixeira, presidente do Conselho Executivo da Escola António Sérgio afirmou, segundo o jornal Correio da Manhã:
“Trata-se de um caso de decência e de cumprimento do regulamento interno, nada tem a ver com a opção sexual dos alunos. Não permitimos beijos, abraços de heterossexuais ou de homossexuais.”
No entanto, quer Rita, quer Jorge Pereira, ambos membros da Associação de Estudantes da referida escola, afirmam que: “Quanto à proibição de beijos no interior da escola, nada há nos estatutos" e que "Nunca se questionaram os namoros dentro da escola até agora. Os beijos e abraços não são proibidos no Regulamento Interno e trocar carinho não é faltar ao respeito".
Muitas vezes, as leis contra "escândalos públicos" ou "atentado ao pudor" são usadas para penalizar pessoas cujo único crime, afinal, é terem a aparência, vestirem-se e/ou comportarem-se de maneira diferente das normas sociais impostas, injustamente, por uma mentalidade rígida. A demonstração de afecto e carinho não é errado. O amor não é um acto escandaloso ou despudorado, como todos concordamos.
O tipo de atitudes relatadas, no contexto da juventude, são ainda mais graves, visto que vários estudos feitos em diversos países do mundo mostram que jovens lésbicas, gays ou bissexuais têm uma taxa pelo menos 3 vezes superior de ideação e tentativa de suicídio em relação aos jovens heterossexuais, assim como uma taxa superior de comportamentos de risco, depressões e insucesso escolar, tudo devido ao preconceito e à discriminação sofrida com base na sua orientação sexual. Um dos espaços onde o preconceito e a discriminação são vividos por este jovens é a escola. A escola tem por função formar todos jovens para a cidadania e para o respeito dos direitos humanos. Por estes motivos a escola é, sem dúvida, um dos locais prioritários onde este tipo de exclusão deve ser combatida.
Também é importante referir que alguns estudos também demonstram que quando o contexto familiar é negativo, após descoberta da orientação sexual de um filho ou de uma filha, a incidência de ideação ou tentativa de suicídio do/a jovem aumenta. Portanto, é um acto muito grave quando um educador decide revelar uma informação tão delicada aos pais, sem autorização e/ou conhecimento do aluno, tal como ocorreu no caso da referida escola.
Neste sentido, a rede ex aequo vem afirmar o seu apoio às jovens envolvidas na situação, bem como à Associação de Estudantes da referida escola pelo comportamento exemplar adoptado.
Infelizmente, o mau exemplo da Escola António Sérgio não é único em Portugal. Em muitas outras escolas do país, jovens homossexuais, ou percepcionados como tal, são vítimas de violência física e/ou psicológica, injúrias ou perseguição. A rede ex aequo tem muitos testemunhos na primeira pessoa de actos de homofobia cometidos tanto por alunos, como por professores e auxiliares de acção educativa. Os mesmos testemunhos podem ser verificados em
http://www.ex-aequo.web.pt/forum/index.php?topic=4068.0.
A rede ex aequo está desde Janeiro deste ano a promover o seu Projecto Educação LGBT (
http://www.ex-aequo.web.pt/projectoeducacao.html). Este projecto, apoiado financeiramente pela Fundação Europeia da Juventude do Conselho da Europa, no âmbito do Programa “Human Rights Education” que terminou em Setembro deste ano, visa uma intervenção educacional através da disseminação de informação sobre os temas da homossexualidade, bissexualidade e transgenderismo entre professores e alunos do 7º ao 12º ano, formadores de professores, professores estagiários e alunos do Ensino Superior.
Com este projecto a rede ex aequo propõe-se a fazer debates em Escolas Básicas ou Secundárias em Portugal e possui uma equipa de jovens oradores especialmente preparados para esta tarefa. Neste sentido, a rede ex aequo gostaria de apresentar desde já a sua disponibilidade e a sua proposta de organizar-se um debate na Escola Secundária António Sérgio.
O conteúdo destes debates aborda as principais temáticas a respeito da orientação sexual e a identidade de género: a discriminação e os estereótipos; o movimento LGBT; as lutas legais, a resposta a questões comuns sobre a homossexualidade e o transgenderismo e o quotidiano de pessoas homo ou bissexuais.
O projecto produziu ainda em formato papel uma brochura para alunos intitulada “Perguntas e Respostas sobre Orientação Sexual e Identidade de Género” (
http://www.ex-aequo.web.pt/arquivo/perguntas.pdf) e uma brochura para professores intitulada “Educar para a Diversidade: Um Guia para Professores sobre Orientação Sexual e Identidade de Género” (brevemente online), com informações, actividades e sugestões de acção, com o objectivo de educar contra a discriminação a pessoas lésbicas, gays, bissexuais ou transgéneras (LGBT).
Por fim, a rede ex aequo irá lançar online, até ao final deste mês, o seu Observatório de Educação, que servirá justamente para receber queixas de situações da natureza da que ocorreu na Escola Secundária António Sérgio, entre outras. Será facultado online um formulário que permitirá qualquer pessoa dar a conhecer situações de homofobia no espaço escolar (de qualquer grau e entre qualquer elemento da comunidade educativa). A rede ex aequo no fim de cada ano lectivo irá fazer o tratamento das queixas recebidas para apresentação ao Ministério de Educação, com o fim do mesmo ser alertado para esta realidade e tomar as medidas necessárias.
Estes projectos estão a ser desenvolvidos para fazer frente à desinformação e à discriminação ainda vigente no campo da Educação em Portugal em relação a este tema, que resultam na transmissão de informação incorrecta, preconceituosa e estereotipada, assim como num ambiente negativo para o dia-a-dia dos jovens LGBT ou com dúvidas, quer em casa ou na rua, mas especialmente no espaço escolar, que têm consequências no bem-estar físico e/ou psicológico do aluno e no seu sucesso escolar.
Estas situações só podem ser contrariadas através da criação de ambientes positivos, abertos e tolerantes em relação às pessoas LGBT e de uma educação para a cidadania e os direitos humanos no campo da orientação sexual e identidade de género. É este um dos principais objectivos do trabalho da rede ex aequo e especificamente da equipa do projecto educação.
Com os melhores cumprimentos,
Pela Equipa do Projecto Educação e pela Direcção da rede ex aequo,
Jorge Santos, Paula Antunes e Rita Paulos
rede ex aequo
associação de jovens lésbicas, gays, bissexuais, transgéneros e
simpatizantes
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