Política & Direitos
Foi hoje divulgado pelo jornal DN uma notícia onde se fala do parecer da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) sobre o Projecto de Revisão do Código Penal e em que, Pedro Albergaria comenta a secção relativa às medidas contra a violência doméstica entre casais do mesmo sexo.
Resumidamente aquilo que é dito no parecer, e foi reafirmado quer na notícia quer por representantes da ASJP a meios de comunicação social, é que não pode existir violência doméstica entre casais do mesmo sexo, uma vez que em Portugal não existe a figura do casamento civil para estes casais.
Diz a lógica que esta alegação deveria também ser estendida a todos os casais de sexo diferente que vivem em União de Facto… segundo o parecer também não poderá haver o crime de violência doméstica, uma vez que não estão casados. Mas já aqui Pedro Albergaria na referida notícia, confessa que não se lembrou ou, por suas palavras, não pensou na "situação dos heterossexuais em união de facto".
Na prática para a ASJP o conceito de violência doméstica reduz-se à situação em que duas pessoas estão casadas pelo civil, como se fosse o acto do casamento civil a razão de existir das leis contra violência doméstica. O parecer dá mesmo o exemplo de situação de violência que não deveria ser coberta pelo código penal a situação de "maus tratos sobre o ex-cônjuge", como se após um divórcio as pessoas em causa não pudessem mais viver juntas ou dependerem uma da outra de alguma forma.
Continuando nesta linha fala-se de "superioridade física do agente sobre a vítima" e mesmo de "substrato sociológico da incriminação da violência sobre o cônjuge" como conceitos não aplicáveis "quando ambos os cônjuges sejam do mesmo sexo". Tal miopia social já é grave, mas piora na frase seguinte ao tornar clara a razão de tanta preocupação da ASJP: para esta associação é "notório" o "valor de bandeira ideológica" da medida proposta, sendo mesmo "promocional".
Se os membros da ASJP procuravam publicidade das suas ideias, encontraram-na mas pelo ridículo das suas afirmações. Disse, e muito bem, o Doutor Rui Pereira, (coordenador da unidade de Missão para a reforma do Código Penal), que não é necessariamente o mais forte fisicamente que maltrata o outro. Mesma ideia partilhada pela A.P.A.V. ao salientar o facto de que estas situações devem ser criminalizadas porque há relações de dependência de alguém sobre quem agride.
Lamento que sejam os impostos de todos nós, e os meus também, que estejam a pagar os honorários de Juízes como Pedro Albergaria, que apesar de tão preocupados com o direito conjugal parecem estar a viver no tempo da outra senhora e por isso ainda não lhes chegou a figura da lei de União de Facto. Desconhecem que mesmo antes destas figuras legais existirem, já coabitavam casais de sexo diferente e do mesmo sexo, e já mesmo nessa altura existia violência doméstica. Desconhecem também que hoje em dia em Portugal 1 em cada 4 crianças nasce fora do casamento civil que tanto os preocupa.
Diz ainda o mesmo Pedro Albergaria que não entende que se legisle por antecipação, isto referindo-se ao facto de que uma vez que não existe o Casamento Civil para casais do mesmo sexo, não faz sentido pensar no assunto. Embora o Doutor Rui Pereira tenha alertado para a ignorância do colega, tenho que reclamar que são posturas destas que fazem que Portugal esteja na posição em que está a diversos níveis.
Teremos que esperar que se legalize o casamento entre pessoas do mesmo sexo para que se pense nisso, é o mesmo que esperar que cheguem os produtos concorrentes de outras paragens para pensarmos em reformar as nossas capacidades produtivas. Legislar por antecipação (que não seria o caso) só é demonstrativo de uma sociedade moderna e em evolução, de uma sociedade que pensa para a frente e que não espera que as coisas aconteçam para depois pensar nelas.
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses deveria também ter pensado melhor no assunto antes de ter emitido este parecer… nem sempre o material promocional funciona da melhor forma.
João Paulo
Editor PortugalGay.PT
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