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Segunda-feira, 14 Junho 2004 00:57

PORTUGAL
O Extra-terrestre Que Era Um Terrestre-extra



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António Variações (1944-1984) morreu fez ontem vinte anos.


No meio musical, é considerado dos maiores renovadores da música portuguesa, mesmo que a sua obra se reduza a três discos editados em menos de dois anos. Na freguesia de Fiscal, em Amares, Minho, onde viveu a infância, ainda é um "mal amado", apesar de na passada quinta-feira aí lhe terem erigido um busto. Os habitantes retêm ainda a imagem de um indivíduo vestido de roupas e cores chocantes e brinco, para além das referências à sua alegada homossexualidade e ao facto de ter sido vitimado pela sida. "Há extra-terrestres e há terrestres-extra. O Variações era dos últimos, era à parte, extravagante. A sua carreira meteórica foi como os melhores", desfia Rui Reininho, líder dos GNR, grupo que esteve na gravação do primeiro disco do "embaixador" minhoto, "Povo que Lavas no Rio/Estou Além" (1982). Outro músico que então integrava os GNR, o guitarrista Vítor Rua, evoca também essa gravação dizendo jamais esquecer que Variações lhe pediu para criar uma música que fizesse "tremer a terra". Reininho - que era cliente habitual da barbearia do autor de "É P'ra Amanhã", em Lisboa - recorda-se particularmente de uma viagem de comboio com Variações, que então usava roupa garrida e papagaio ao ombro, e de vê-lo "saudar sorridente e de modo presidencial" os alunos do secundário entrados em Algés. "Este António é um dos santos que zela por nós." Zé Pedro, dos Xutos & Pontapés, não o chegou a conhecer pessoalmente, mas lembra-se de o músico não-alinhado ser tema recorrente nas noites do Bairro Alto lisboeta. "Quando apareceu, foi uma pedrada no charco", sublinha o guitarrista. Já Pedro Abrunhosa valoriza a voz invulgar e, principalmente, as letras "de carácter urbano", pontuadas por Fernando Pessoa, que marcaram "irreversivelmente" a diferença da pop portuguesa. "Toda a gente conhece a sua assinatura, ninguém canta como ele, nem faz música vanguardista assim", acentua. Reininho reforça a ideia. "Se o Variações tivesse continuado, tinha inventado o pop pimba; o que veio a seguir era uma fábrica de 'playbacks' e versões lançada pela TV, o chamado 'british pimba'", acrescenta. [...] Misturando a figura bizarra de cabelos coloridos e roupas extravagantes, letras de provérbios, sabedoria popular e pós-revolucionárias e ainda a característica melodia que fundia folclore (que ouvia em casa, em miúdo), dança (das discotecas de Lisboa), rock (do "boom" dos 80) e fado (Amália Rodrigues foi a sua diva), o barbeiro António Joaquim Rodrigues Ribeiro (nascido a 3 de Dezembro de 1944) conseguiu reunir à sua volta novos e velhos, cidade e campo, rádio e imprensa. Variações deixou três discos - o "single" "Povo que Lavas no Rio/Estou Além" (1982) e os álbuns "Anjo da Guarda" (1983) e "Dar & Receber" (1984) -, tendo falecido no pico da criatividade, devido a uma paragem cárdio-respiratória, supostamente provocada pela sida - terá sido a primeira vítima conhecida desta doença no nosso país. Em 1987, os Delfins gravaram a versão de "Canção de Engate" e, dois anos volvidos, Lena d'Água lançou "Tu Aqui", com nove inéditos do cantor-compositor. Em 1994, foi-lhe dedicado um disco-tributo, com versões de Sérgio Godinho, Delfins, Madredeus, Resistência e Mão Morta, entre outros. Em 1997, Variações chegou a n.º 1 no top português com o "Best of" da sua carreira.

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