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9/11 One Year Later, New York, USA

Reportagem Especial
9/11/02
por Rex Wockner

Faz agora um ano desde que o meu agora-falecido Pai acordou-me com uma chamada e disse algo como, "O World Trade Center acabou de cair."

Na altura pensei que ele estava com delírios mas de qualquer forma acordei a minha outra metade e liguei a televisão. Como vocês, passei o resto do dia colado ao ecran. Tinha o meu computador portátil na cama comigo, usando e-mail e o telefone Internet para comunicar com dirigentes gays e testemunhas em Nova Iorque.

Escrevi uma longa reportagem sobre a reacção dos gays e a perspectiva gay da questão. Fui o primeiro jornalista a indicar que o Padre Mychal Judge era homossexual e alguns dos meus editores submeteram-me a uma dose incomum de verificação de factos durante essa semana. Obviamente, isto tudo foi agora relatado pela Associated Press, o New York Times, e todos os outros.

Esta semana voltei a falar com os entrevistados de Nova Iorque e Washington das minhas reportagens originais e, se bem que com alguma dificuldade, convenci-os a partilharem os seu pensamentos e sentimentos passado um ano.

Andy Humm

O activista gay verterano de Nova Iorque e jornalista, Andy Humm: "Levei cinco meses para voltar a viajar de avião depois do 11 de Setembro, principalmente devido aos novos problemas nos aeroportos, e porque nenhuma viagem parecia ser suficientemente importante para arriscar. O meu parceiro, que viu as Torres Gémeas a cair mesmo do outro lado do rio Hudson, começou "a deitar fumo", criando novos conflitos na frente caseira. Tive vergonha de me divertir por semanas. ... Como freelancer, não havia nada para escrever além do 9/11 [nota] durante uns tempos -- incluindo reportagens relacionadas com gays como o Padre Mychal Judge e a luta dos parceiros gays sobreviventes. A catástrofe deu às pessoas um novo apreço pela nossa humanidade. ... Qualquer coisa terrível parece possível em Nova Iorque hoje em dia, incluindo a aniquilação nuclear. Não penso muito no assunto, mas de vez em quando, olho para uma cena numa rua particularmente animada e tiro uma fotografia mental, imaginando que isto era o que estavamos fazendo quanto tudo terminou."

Nota de tradução: neste texto utilizou-se a expressão 9/11 para indicar o 11 de Setembro pois é a forma mais comum de indicar datas para os Norte Americanos. Da mesma forma manteve-se a expressão "América" e "Americanos" quando se poderia ter utilizado "Estados Unidos da América" e "Norte Americanos" pois todo o texto original foi escrito por Norte Americanos.

Michael Musto

O colunista Village Voice, Michael Musto: "Uma das consequências positivas da tragédia de 9/11, por incrível que pareça, foi que certos temas gays passaram mais para o centro das atenções. O mundo descobriu que o heroísmo gay ajudou a desviar o avião na Pensilvânia; Padre Mychal Judge apareceu como um guia espiritual gay; e a luta por direitos dos parceiros gays das vítimas do 9/11 for relatada, quando os que estavam de luto tentavam receber remunerações e reconhecimento. Há um ano atrás, escrevi sobre alguns destes temas (e do facto de não permitirem aos homens homossexuais doarem sangue), e recebi mensagens agressivas de correio electrónico afirmando: 'Agora não é a altura certa para lutar pelos direitos dos gays. Agora é o momento para nos concentrarmos "na Guerra"'. Respondi que agora, mais que nunca, a nossa democracia estava a ser testada, e era importante mostrar como somos diferentes das tiranias que estavamos contra. Neste momento, houve mais discussões e talvez uma maior consciencialização acerca do papel dos gays na América. Se calhar unidos pelo horror, a nossa sociedade foi capaz de andar em frente um bocadinho.".

Andres Duque

Andres Duque da Comissão Latina de Luta Contra a SIDA em Nova Iorque: "A vida continua em Nova Iorque e algumas vezes parece que não aconteceu nada de especial. A Zona de Impacto tornou-se numa atracção turística e o 9/11 passou a ser '9/11: O Parque Temático.' ... As pessoas de Nova Iorque parecem muito ambivalentes em relação a assinalar o aniversário. A aparição espontânea de milhares de panfletos com imagens daqueles que se receava estarem mortos e que nos uniu a todos num luto colectivo já passou. Também já desapareceram as bandeiras Americanas que floresceram em todos os quarteirões numa manifestação sem precedentes de verdadeiro patriotismo e luto, independentemente de origens étnicas ou nacionalidade. Felizmente, alguém capturou todas estas emoções numa verdadeira recordação de como os Nova Iorquinos se sentiram sobre aquele dia. O album The Rising de Bruce Springsteen captura exactamente como me senti desde a altura, e provavelemte vou assinalar o 9/11 ouvindo este album o dia todo."

Barbara Rabb

A produtora de uma rede de notícias, Barbara Rabb: "Ao contrário da 'meditação' que é muitas vezes atingida quando se marca o primeiro aniversário de uma grande perda, tenho algumas vezes receio que as comemorações vão apenas reabrir as feridas que acabaram de sarar, e que a cidade que eu amo irá ter um depressão colectiva. ... A outra questão de que estou claramente consciente é que o 'ataque à América' já não ecoa da mesma forma pela América como acontecia quando havia recordações diárias do mesmo. As pessoas ainda se referem ao mesmo, falam do assunto, e mencionam pequenas e grandes coisas que mudaram devido ao mesmo. Algumas linhas do metro ainda não funcionam da mesma forma que antes do 9/11; os quarteis dos bombeiros ainda têm fotografias dos homens que perderam; o meu jornal diário tem encartes especiais encorajando os Nova Iorquinos a 'Voltarem à Baixa'. Quando o metro pára num tunel sem razão aparente, é como se todas as pessoas na carruagem tivessem um balãozinho de pensamento de banda desenhada em cima dizendo 'Oh oh... o que aconteceu de errado?' ... Ruidos fortes são mais assustadores, os aviões passam por cima das nossas cabeças de forma mais ameaçadora, parece que quase que sabemos que toda a gente está no limite de uma forma que não estavam antes. ... Eu continuo a dizer que estamos tão inseguros como no dia 10 de Setembro do ano passado, só que não sabíamos -- mas não passo daí."

Sean Strub

O fundador da revista POZ, Sean Strub: "A minha resposta é em duas direcções, uma pessoal e movida pela perda e dor e a outra política movida por um sentimento de pena pelo facto de tantos líderes da comunidade terem saltado para o bloco de fala-baratos nacionalistas tentando mostrar que nós eramos mais patrióticos que todos os outros. Sinto que poderíamos ter feito algo de melhor, se bem que não saiba muito bem do que poderia ter sido."

Jay Blotcher

Jay Blotcher, jornalista e antigo relações com os média da ACT UP e da AmFAR: "Tive a confirmação das minhas visões mais negras da vida Americana pelo que vi no dia 11 de Setembro, quando estava no meio da Sexta Avenida na Village com centenas de pessoas quando a segunda torre colapsou. Nas semanas seguintes muitas das minhas amizades foram violentamente testadas quando disse o que pensava ... contra a posição simplista 'matem-nos a todos' de pessoas que não compreenderam que Bush pai e filho tinham construído as fundações para estes ataques com a sua política externa ruinosa. Nos meses que se seguiram, Bush consegui desviar-se das questões difíceis impondo a 'Guerra ao Terrorismo' que fez com que todos os opositores fossem imediatamente apontados como traidores. Alguns dos membros dos média questionaram esta loucura, mas tenho medo que o aniversário dos ataques possa novamente facilitar a mentalidade encravada dos Americanos e apoiar novos bombardeamentos, mortes e detenções em nome da 'justiça'."

John Aravosis

Activista e jornalista de Washigton, John Aravosis: "É muito fácil ser um defensor dos direitos humanos quando os nossos objectivos não ameaçam a sobrevivência da nossa nação. Mas com o 11 de Setembro, muitos dos temas de direitos humanos que defendemos -- oposição à tipificação racial, suporte incondicional da livre expressão, liberdade de associação, e liberdade de religião -- repentinamente pareceram um bocadinho menos sólidos. Antes do 11 de Setembro, sempre acreditamos que proteger os direitos das minorias iria fortalecer a América, não enfraquecê-la. Mas a nossa crença floresceu num mundo em que a sobrevivência da América era dada como certa. ... A nossa geração nunca teve que pensar se a manutenção desses direitos poderia de alguma forma afectar a continuação da nossa nação. Agora temos de pensar o contrário. ... Será que o medo do terrorismo irá diluir a nossa preocupação particular com temas como privacidade e tipificação racial? Eu acho que já o fez. A pergunta é: 'Deveria?' No dia 10 de Setembro eu teria dito 'Claro que não.' Hoje, sinceramente já não sei. Esta reavaliação das nossas prioridades e crenças que pensavamos certas durante tanto tempo, mas que raramente questionavamos, é a verdadeira herança do 11 de Setembro.".

Michelangelo Signorile

O autor Michelangelo Signorile: "Tive uma mistura de emoções no ano que passou. O meu companheiro David e eu estamos mais próximos da minha família, e toda a família está mais coesa. O meu pai e os meus irmãos tiveram sorte: passaram por cima dos danos nos seus restaurantes e puseram o negócio de pé de novo. Mas perderam tantos amigos e colegas. No que me toca, bin Landen e os terroristas deveriam arder no inferno para sempre. Mas estou cada vez mais lixado com aqueles que se aproveitaram desta tragédia. Na frente e no centro desta questão está a administração Bush, que usou a resposta aos ataques -- e está agora desajeitadamente levando-nos para uma guerra perigosa com o Iraque, se bem que nunca foi provado que Saddam tenha estado relacionado com tudo isto -- para desviar as atenções das políticas pavorosas da Casa Branca e do passado reles empresarial do presidente e vice presidente. Os verdadeiros patriotas de 9/11 não os deixarão sair impunes."

Ralph Buchalter

O meu amigo Ralph Buchalter que trabalha na American Stock Exchange e que testemunhou o impacto do segundo avião: "Algumas das minhas memórias mais vivas são dos dias de outono e inverno em que tive de passar junto à zona do Trade Center para ir para o trabalho todos os dias, antes dos turistas aparecerem, e o monte de escombros ainda fumegava e as gruas ainda tentavam remover o metal. ... Todas as manhãs as portas do metro abriam-se na estação de Broadway-Nassau na linha A, e cada um de nós em trânsito eramos comprimentados com um cheiro horrível a metal queimado que nunca esquecerei. Quando uma tia minha de Memphis me perguntou na altura do Natal se eu tinha-me voluntariado para passar garrafas de água na Zona de Impacto, quis responder que o meu esforço de voluntariado estava marcado pelo ranho negro que assoava do meu nariz todas as noites só porque tinha voltado ao trabalho alí em baixo."

"Como um homem homossexual em Nova Iorque," continua Ralph, "o que senti no último ano foi uma diminuição nas diferenças relativas entre homossexuais e heterossexuais quando lutavamos contra as diferenças que os ataques focaram entre o Ocidente e o não-Ocidente. As bandeiras Americanas que decoravam literalmente todos os bares gays na cidade pareciam marcar este evento como um em que os homosseuxais estavam literalmente e abertamente inseridos e de uma forma que nunca tinha acontecido antes. Devido ao 'movimento gay', qualquer que seja a forma como o definimos desde os últimos 25 anos e qualquer que seja a nossa desilusão com o mesmo hoje em dia, havia trabalhadores abertamente homossexuais no Trade Center, com amigos e parceiros no exterior, e o seu desaparecimento nessa manhã pôs-nos a todos directamente dentro da caixinha."

Os meus pensamentos

Não viajei de avião durante 10 semanas após o 9/11. Então o meu Pai faleceu e ví-me no interior de um avião a caminho dos campos de milho de Illinois poucas horas depois. Isso fez-me ultrapassar essa barreira. Sempre odiei voar, e ainda odeio. Quando os aviões explodem e caiem do ceu, nunca há sobreviventes.

O meu amigo Clint, eu e as pessoas com quem ele trabalha estiveram em luta contra um virus incomum nas últimas semanas com sintomas raros. Antes do meu médico garantir-me que era uma "coisa" que andava por aí e que toda a família dele a tinha apanhado, Clint e eu pensamos em voz alta, "Talvez os terroristas tenham posto algo na água de San Diego." O facto de estarmos 10% sérios ao afirmar isto é uma das consequências desta realidade pós 9/11.

Tive que fazer viagens intercontinentais três vezes desde 9/11 e acho que as pessoas são um bocadinho mais simpáticas com os Americanos. Este efeito não vai durar muito tempo, mas foi interessante ser odiado um bocadinho menos que o habitual devido ao defeito de ter nascido num certo país. Muitas pessoas no resto do mundo têm uma relção de amor/ódio, fascínio/repúdio com a América que, após o 9/11, parece ter balançado um bocadinhozito para o lado do amor por uns tempos.

Eu sou uma daquelas pessoas que espera que caiam mais coisas da prateleira. A água pode estar envenenada, as pontes podem ruir, pode ser libertada radiação, e existe mais uma dezena de cenários assustadores.

Pelo menos, um ano depois, acho que detectei alguma complacência entre o público em geral e nos funcionários públicos. Eu voto nos Democratas excepto quando voto à esquerda dos Democratas -- para o Partido Os Verdes, o Partido Paz e Liberdade, etc. Não sou um conservador. Mas sinto que o governo não consegui evitar a entrada de terroristas e a sua livre movimentação nos Estados Unidos.

Se queremos evitar mais 9/11s, o Big Brother tem de mostrar mais interesse em quem está por aqui, de onde vieram, o que fizeram no passado, e o que pretendem fazer. É lixado. E é necessário.

Rex Wockner.

tradução PortugalGay.PT

 
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