O protagonismo das mulheres na vida política portuguesa é muito inferior ao alcançado noutros contextos, como o mercado de trabalho, o ensino ou a família. Isto deve-se à dominação masculina que se verifica nos partidos políticos e nas práticas discriminatórias que dificultam o acesso das mulheres ao topo das hierarquias partidárias e, em consequência, ao Parlamento e ao Governo.
Estas são as principais conclusões do estudo "O modo de funcionamento dos partidos e o seu reflexo na participação das mulheres na vida partidária", elaborado por uma equipa do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) formada por Manuel Meirinho Martins, o coordenador, Maria da Conceição Teixeira e Jorge de Sá. O estudo foi encomendado pela presidente da Comissão para a Igualdade e para os Direitos da Mulher, Maria Amélia Paiva, e foi ontem apresentado publicamente uma conferência no ISCSP.
Segundo os dados recolhidos e um inquérito promovido no âmbito do estudo, os investigadores concluem que partidos promovem e mantêm uma "democracia excludente". Ou seja "Sendo maioritariamente dominados por homens, ou excluem e discriminam as mulheres no acesso aos órgãos directivos internos e aos cargos públicos electivos, ou incluem-nas nas listas de candidatura como mera estratégia eleitoralista, reduzindo assim a participação política das mulheres ao apelo ao voto junto do eleitorado feminino".
São vários os indicadores que suportam esta conclusão. A participação das mulheres nas listas de deputados é muito inferior à masculina - e, para além disso, as mulheres são colocadas em poucos lugares elegíveis. No que respeita aos órgãos partidários isso também é visível no CDS, por exemplo, em que as mulheres são 41% dos militantes, a sua presença no órgão executivo nacional não ultrapassa os 6%.
O PSD e o PS -- cujas percentagens de militantes femininos são de 37% e 33% - apresentam taxas de feminização das sua direcções de 16,7% e 16,3%, respectivamente. Um pouco pior está o PCP, onde, com 29% dos militantes, as mulheres alcançam apenas 6,2% da direcção. O Bloco de Esquerda, com os seus 50%, é a única força que inclui nos estatutos o princípio da paridade entre sexos nas listas de candidatura aos órgãos nacionais.
"Tomáramos nós que não houvesse necessidade de fazer este encontro", suspirou Teresa Caeiro, deputada do CDS/PP e ex-secretária de Estado, no debate que, à tarde, discutiu o papel condicionador dos partidos. Mas, como não tinha lido o estudo sobre o qual era suposto falar, pouco mais disse. Também Sónia Fertuzinhos, do PS, não tinha dedicado ao estudo mais do que uma olhadela pelas conclusões, pelo que se limitou a contar experiências pessoais da sua vida partidária.
Foi Helena Pinto, do Bloco de Esquerda, a colocar a discussão noutro nível. "Não acho essencial discutir se as mulheres fazem política de forma diferente", disse a deputada. "A questão fundamental é que a humanidade é composta por dois sexos portanto, a questão é de democracia, de direitos humanos se neles incluirmos a participação cívica". E realçou a "invisibilidade" a que muitas mulheres que se envolvem na política estão ainda hoje votadas.
Regina Bastos, do PSD, avançou uma explicação para esse facto. "Todos os partidos, ao nível dos seus dirigentes nacionais, recomendam sempre uma participação elevada das mulheres, nomedamente nas listas de candidatos a deputados". O que sucede, porém, é que "a lógica organizativa dos partidos, que é gerada em patamares intermédios, favorece a lógica masculinizadora que as listas acabam por assumir".
A deputada reconheceu que o que se passou com o PSD na elaboração de listas para as últimas eleições não foi brilhante - apenas seis mulheres em 75 deputados eleitos. "Foi um retrocesso quanto ao que o partido tinha feito em 30 anos de democracia". E acrescentou que "é hoje consensual que um dos indicadores de desenvolvimento de uma sociedade é o nível de participação das mulheres na vida política e em lugares de decisão".
Se houve partido português que teve isso em atenção no passado foi o PCP, que já em 1952, numa nota do Comité Central, criticava militantes e órgãos do partido por "substimarem o papel das mulheres na sua própria emancipação". Quem o recordou foi Fernanda Mateus, deputada comunista, que frisou depois os actuais constrangimentos económicos, sociais e familiares à participação feminina.